QUANDO A BIOLOGIA TEM QUE FAZER A DIFERENÇA

Resumo: O texto atual é na verdade uma homenagem em comemorativa do Dia do Biólogo (03/09) e também um chamamento aos Biólogos brasileiros para que invistam melhor e divulguem mais sobre a importância da Biologia e do conhecimento biológico nos tempos atuais. O texto ressalta a necessidade do governo e da mídia promoverem e intensificarem as ações em prol da manutenção da vida humana sobre a Terra e indica que a Biologia e os Biólogos devem ser os principais protagonistas dessas respectivas ações.


QUANDO A BIOLOGIA TEM QUE FAZER A DIFERENÇA

Nos tempos atuais é relativamente comum encontrarmos aleatoriamente, aqui e ali, pessoas envolvidas com as questões ambientais e particularmente preocupadas e com a degradação ambiental em escala planetária causada pelas atividades antrópicas. A Terra já não suporta mais o “bicho homem” e por conta das nossas ações, o ano que deveria durar 365/366 dias completos, “tem terminado cada vez mais cedo”. Este ano de 2016, até aqui o mais curto, chegou ao fim no dia 8 de agosto. Vou esclarecer melhor, pois obviamente o ano continua, de fato, tendo 365/366 dias, mas os recursos possíveis de serem utilizados pela humanidade por ano, têm progressivamente acabado bem antes do final do ano. Embora o ano não tenha acabado, os recursos teoricamente disponíveis deste ano já se foram.

Assim, dos 365 dias deste ano de 2016, os últimos 145, já foram tomadores de recursos que seriam programados para o ano que vem. O pior é que esses recursos também estão se perdendo na ampliação do passivo ambiental que a humanidade tem construído ao longo da história. Na verdade temos vivido uma ilusão semelhante ao “cheque especial”, você gasta aquilo não tem e depois tem que pagar os débitos, com os devidos juros. O problema é que na natureza não existe juros, para cobrir o rombo e o que está perdido, está real e efetivamente perdido. Ou seja, a cada ano perdemos um pouco mais do planeta e de acordo com a maneira como vivemos, não temos como recuperar essa perda e assim o débito só aumenta. Essa situação, obviamente precisa ter um fim, porque se isso continuar, muito brevemente a coisa vai ficar totalmente inviável e aí ninguém, de antemão, pode afirmar o que irá acontecer.

Obviamente existem vários profissionais, das mais diversas áreas do conhecimento e atividades, envolvidos direta ou indiretamente com as questões ambientais em todo o mundo e obviamente todo esse pessoal está bastante preocupado com a situação crítica que se apresenta na Terra. Entretanto, a maior parte desse contingente de ambientalistas, constitui-se de pessoas abnegadas, as quais, por puro “feeling”, ou por fatores e interesses próprios, se engajaram na luta pela melhoria da qualidade de vida e do meio ambiente, mas sem nenhum jeito e principalmente, sem qualquer conhecimento de causa. Na realidade, não existe quase nada institucionalizado na maioria dos países e assim essas pessoas lutam por que querem, por causa própria ou como se fossem rebeldes sem causa.

A Organização das Nações Unidas (ONU), por sua vez, através do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), a partir de agosto de 2000, criou os 8 Objetivos do Desenvolvimento do Milênio (ODM), os quais foram recentemente substituídos e ampliados pelos 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) e incluídos na chamada “Agenda 2030”. Porém, esses ODS parecem ter sido criados, muito mais como justificativa para apresentar trabalho do que efetivamente para resolver problemas. A “Agenda 2030”, embora muito interessante, não parece ter contagiado a maioria dos 165 países signatários e assim, tudo continua como “dantes no quartel de Abrantes”.

Na área estritamente ambiental, de fato, nada se faz para reduzir o uso dos recursos naturais e reduzir os impactos planetários, ao contrário a exploração insana continua progressivamente. Na área econômica, nada se faz para conter o consumismo inconsequente, ao contrário a propaganda praticamente obriga o cidadão comum a comprar e consumir. Na área social as coisas continuam seguindo praticamente da mesma maneira que estavam antes da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (Rio, 92) e pouco se fez para melhorar de fato a vida das comunidades mais carentes do mundo. Quer dizer, na realidade nós continuamos na mesma balada de violência contra o planeta e as ações efetivas de mudança são muito tímidas ou não acontecem. É claro que existiram melhorias pontuais, mas essas foram pouco significativas para mudar a tendência do quadro drástico que se vivencia.

Por outro lado, nós Biólogos, somos profissionais que temos a devida dimensão da desgraça, pois sabemos exatamente ou deveríamos saber, o que está realmente acontecendo e temos a responsabilidade maior de informar a verdade, de maneira clara e correta, para os demais setores da sociedade, além de exigir a postura adequada dos administradores públicos e sugerir as mudanças efetivas. Cabe lembrar que, pelo menos aqui no Brasil, o governo e a mídia não cumprem bem a obrigação de proteger e divulgar sobre o meio ambiente e tudo que a ele se relaciona.

A Constituição Federal no artigo 225 diz que: “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações”. (Grifo nosso), porém isso tem sido mais “para inglês ver”, do que para orientar os cidadãos brasileiros sobre as verdades. É aquele binômio antagônico que todos já conhecem: “a lei é boa, mas o governo é ruim” e assim o que está no papel, continua apenas e tão somente no papel.

Por conta desse lamentável clima de irresponsabilidade generalizada do governo e pelo desinteresse da mídia, só sobraram a Biologia, o conhecimento biológico e os Biólogos para tentar informar sobre como proceder nas questões ambientais e assim tentar separar o joio do trigo, entre a picaretagem imposta por setores do governo e principalmente da mídia, que só se manifesta quando tem algum interesse significativo, mas sempre tangenciando a questão para não se envolver e correr o risco de perder alguma vantagem adicional. É preciso estar atento à Legislação que anda em constante mudança para atender aos interesses escusos e inverídicos e também a propaganda perniciosa que circula por aí deformando a realidade das questões ambientais.

Recentemente foi encaminhado ao Congresso, o Projeto de Lei (PL) 3200/15, do deputado Covatti Filho (PP-RS). O citado deputado tratava agrotóxico (veneno), com o singelo nome de “produto fitossanitário” e pretendia substituir a atual Lei de Agrotóxicos (Lei Federal 7.802/1989) e ninguém ouviu falar nada sobre isso, tão pouco a imprensa publicou alguma coisa, sobre a tal “comissão especial” que seria criada para analisar o referido projeto e muito menos sobre o andamento desses trabalhos. Em março de 2016, o referido projeto foi apresentado e aprovado por unanimidade no Parlamento do Mercosul sob coordenação do senador Roberto Requião (PMDB-PR) e teria sido aprovado no Senado se não fossem as pressões dos ambientalistas e da sociedade civil em geral, através das redes sociais e também através de cobranças mais diretas sobre alguns parlamentares. Mas, por felicidade, os ambientalistas, aqueles abnegados de quem falei acima, ganharam mais uma batalha e o projeto foi arquivado.

Entretanto, não dá para esmorecer, porque outros do mesmo nível, visando facilitar os interesses das empresas produtoras desses venenos estão embrionados por aí e breve vão tentar eclodir. É preciso ficarmos atentos, porque os interesses são muitos e a mídia não fala nada sobre o assunto. O lobby do setor agroquímico é muito grande e muito forte, pois cala a boca da imprensa, ludibria alguns setores do governo que deveriam impedir certas leis e “gratifica” outros setores governamentais para conseguir seu intento. Então, a diferença para tentar equilibrar essa balança absurda de interesses perniciosos para alguns ambientes específicos, ou para o planeta como um todo, só pode ser feita pelos setores mais radicais do ambientalismo e por setores técnicos e científicos da Biologia Ambiental (Ecologia) como ciência e pelos respectivos profissionais dessa área.

As questões ambientais necessitam ser tratadas como prioridades científicas, antes de interesse políticos e principalmente devem ser entendidas especificamente como necessidades ambientais e sociais, antes de quaisquer interesses puramente econômicos. Essas questões precisam ser consideradas como prioridades máximas, dentro de preceitos estritamente biológicos, porque do contrário, não haverá solução para a maioria das questões planetárias e para a continuidade da espécie humana na Terra.

É necessário que sejam desenvolvidos programas de orientação e divulgação verdadeiros, com boas técnicas de linguagem e comunicação, para que o Brasil possa recuperar o passivo ambiental, além de promover e aplicar novos padrões tecnológicos no setor de meio ambiente. Esses programas deverão divulgar, informar e principalmente transmitir para as comunidades todas as alternativas possíveis nas diferentes questões. Os órgãos ambientais precisam cumprir as suas obrigações legais e desta maneira se estabelecerem como órgãos ambientais de fato e de direito, deixando de fazer concessões absurdas para grupos de interesses.

Como já foi dito, no atual estado de coisas, além dos ambientalistas, apenas a Biologia e nós Biólogos, somos os responsáveis primários por levantar os problemas, identificar suas causas e propor metodologias para as respectivas soluções, encaminhando essas informações aos governos (nas 3 esferas do Poder) e à mídia. Por outro lado, existe a necessidade de que essas coisas sejam efetivamente promovidas pela mídia e tratadas com a devida austeridade pelos governos. Os setores de meio ambiente dos governos foram criados e existem para garantir a manutenção dos ambientes em condições sadias e equilibradas, perpetuando a qualidade ambiental e não para defender interesses corporativistas de quem quer que seja.

Transparência nas ações é a condição primária para a manutenção da qualidade ambiental e somente a Biologia, como ciência da vida, desobrigada de qualquer envolvimento com outras causas e interesses, será capaz de produzir ressonância e trazer as respostas comunitárias e sociais, integralmente compatíveis com os verdadeiros interesses planetários. Os anseios de vida longa para a nossa espécie, dependem totalmente das condições planetárias favoráveis e somente atitudes biocêntricas poderão conduzir a humanidade à possibilidade de uma existência mais longa no planeta.

Nós Biólogos, temos, pois, que fazer o dever de casa, que consiste em: introduzir o cérebro na pesquisa, enfiar a mão na massa e a colocar a boca no trombone. Só nós, profissionais da Biologia, de fato e de direito, somos capazes de entender que a extinção prematura da espécie humana se aproxima de forma clara e rápida. Por outro lado, também só nós somos capazes de interceder e tentar impedir que essa desgraça ocorra tão rápido quanto se desenha. Parece incrível, mas o mundo necessita de nós e conforme o tempo passa, essa dependência está ficando cada vez maior e não é possível que apenas alguns de nós participem mais ativamente dessa luta pela manutenção da vida humana na Terra.

Essa verdade insofismável e também bastante inconveniente, de que a espécie humana está perto do fim, ainda não parece ter sido entendida pelas comunidades pelo mundo afora e aqui no Brasil menos ainda. Aliás, a sociedade em geral, nem tem, absolutamente, nenhum conhecimento de que esse é um risco real iminente, até porque, além da própria mídia não acreditar nisso e dos governos não estarem nem aí para esse fato, muitas religiões atuam na contramão da humanidade e a favor da extinção da espécie, porque se mantêm arcaicas e reforçam os erros produzidos ao longo da história. Assim, ninguém encara as questões ambientais globais dentro da realidade e seguimos “brincando com fogo”, até que o fim da humanidade chegue.

Somente com uma mudança radical de comportamento é que vamos conseguir nos manter vivos no planeta por um tempo mais significativo. A Biologia tem que fazer a diferença para que essa mudança aconteça. Isto é, as verdades biológicas relacionadas com a dinâmica das populações, com o crescimento exacerbado das populações, com a resistência do meio, com a limitação física dos ambientes e outras, precisam ser ditas e evidenciadas para toda população humana, independentemente de qualquer interesse contrário.

É preciso dar uma chance a humanidade para que ela, pelo menos, possa tentar não sucumbir tão rápida e assustadoramente. Questões individuais ou mesmo de grupos específicos não podem mais ser respaldadas ou consideradas interessantes e nem devem servir de modelos, pois apenas os interesses planetários coletivos e a manutenção da espécie humana têm que ser as únicas prioridades para a humanidade e o povo brasileiro precisa estar efetivamente engajado nesse princípio.

Que nesse 3 de setembro, em que completamos 37 anos de regulamentação de nossa profissão, nós Biólogos brasileiros, sejamos capazes de levar a cabo essa ideia da importância da Biologia na luta pela preservação do planeta e da vida, particularmente aqui no Brasil, onde ainda existe bastante falta entendimento e interesse dos governantes, da mídia e consequentemente das comunidades. E necessário também, que esse 3 de setembro seja um marco para que nossa profissão possa crescer para tentar alcançar o mesmo nível de importância que já conseguiu em outros países.  Se a Biologia como ciência e possivelmente a única alternativa viável para as soluções planetárias, o Biólogo como profissional da Biologia tem que ser o ator principal no solucionamento dos problemas planetários e o Brasil precisa saber disso. Parabéns a todos e vamos à luta.

Luiz Eduardo Corrêa Lima

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