Tag: Fauna

26 abr 2019

Os “Pets” e a Legislação Brasileira

Segundo um trabalho publicado pelo IBGE, em 2014 e ainda segundo uma pesquisa desenvolvida na Universidade de São Paulo e veiculada pela imprensa no final de 2016, o Brasil é o 4º país do mundo em número de animais de estimação, num total de 132,4 milhões, sendo o 2º maior em número de cães, gatos e aves canoras e ornamentais, o 9º em número de répteis e pequenos mamíferos e o 10º em número de peixes ornamentais. E a taxa de crescimento desses números prevista para 2015 era superior de 7,8%.

Isto é, se a coisa continuou como estava sendo esperada naquele momento da pesquisa, hoje (considerando o final de 2018 e um crescimento médio de 7% ao ano), o Brasil deve ter, pelo menos, 173 milhões de animais de estimação. Se aliados a isso, também incluirmos o rebanho agrícola de bovinos (218,2 milhões de cabeças em 2016), que cresce por volta de 1,5% ao ano e hoje deve estar na casa de 224 milhões. E se ainda somássemos os mais de 42 milhões de porcos e mais os quase 2 bilhões de galináceos, poderíamos dizer que realmente existe um contingente imenso de animais de estimação e de animais de interesse agropecuário no país.

Além disso, também devemos considerar que o Brasil é o maior país do mundo em Biodiversidade e que possivelmente nosso país possua a maior quantidade de animais do planeta. Bem, essa fauna nativa, pelo menos em tese e em certo sentido, está (ou deveria estar) protegida pela Legislação Ambiental Brasileira. Pois então, a fauna nativa, os animais silvestres, se não estão totalmente protegidos, pelo menos têm algumas leis que permitem a sua proteção na natureza. Meu Deus, existe uma quantidade incomensurável de animais nesse país e a meu ver todos eles deveriam ser tratados da mesma maneira, mas, como sabemos não é assim que acontece e os animais de estimação (Pets) acabam sendo os mais esquecidos pela legislação, porque não há quase nenhum tipo de controle legal sobre eles e seus respectivos “donos”.

Por outro lado, é preciso dizer que os Pets e os animais de interesse agropecuários, embora vivos, ainda são entendidos aqui no Brasil e em grande parte do mundo apenas como objetos ou coisas, ou, o que é pior ainda, como produtos ou mercadorias pertencentes a alguém. Esse alguém pode teoricamente ser qualquer pessoa física ou jurídica, mas muitas vezes não é ninguém, porque esse sujeito não existe juridicamente, haja vista que ninguém é obrigado a declarar que possui animais de estimação ou mesmo alguns animas de interesse agropecuário para fins de subsistência em casa e muito menos qual o número desses animais.

Em suma, nativos ou não, o Brasil tem muitos animais e precisa moralizar o tratamento a ser dado a todos eles, independentemente de ser endêmico ou criado artificialmente, porque, por questões óbvias, acredito que a responsabilidade do ser humano perante a fauna, salvo melhor juízo, deve ser a mesma. Quer dizer, não é possível imaginar que um gambá ou uma onça sejam mais importantes que um cachorro ou um gato doméstico, apenas por serem animais nativos. Em contrapartida, também não se deve achar que um cachorro ou um gato também possam ser mais importantes apenas porque têm “pedigree”, ou porque custaram mais caro ao “dono”. Animais são animais e não há melhor e nem pior. Animais são seres biológicos assim como nós e merecem ser tratados com isonomia e com todos os mesmos cuidados que temos com os demais humanos.

Então, alguns consideram que um animal de estimação é como uma camisa, um sapato ou pior ainda, como um sabonete, que o “dono” usa na sua casa e pode fazer o que quiser, pode até matar e ninguém ficará sabendo ou perguntará porque matou, pois o animal era seu e não há necessidade de justificar o que ele faz com suas coisas de pouco valor. Sim, isso mesmo, de pouco valor, porque as de grande valor, carros, casas e outros, precisam ter os seus diferentes caminhos justificados. Mas, os animais de estimação, infelizmente, são coisas insignificantes na legislação brasileira e assim, o “dono” pode fazer o que quiser com eles.

Isto é, como o animal é uma propriedade do “dono”, da mesma maneira que ele trata aquela camisa velha que ele resolveu transformar em pano de chão ou incinerar, ele também pode tratar os animais sob sua tutela. Ou então, como aquele sapato, que depois de anos de uso, não serviu mais e ele optou por jogar no lixo. Ou, pior ainda, como aquele sabonete que se gastou por conta do uso e simplesmente sumiu. Lamentavelmente, ninguém questiona sobre os animais, que desaparecem como sabonetes, mas isso é mais comum do que se pode imaginar. Ora, essas ações de descarte são simples e comuns, quando se trata de objetos, como os citados, porém os animais são entidades orgânicas, vivas, que sentem e sofrem como nós e não podem ser comparadas com simples produtos de uso pessoal de quem quer que seja.

É bom lembrar que, do ponto de vista biológico, nós também somos animais e que até mesmo algumas religiões, inclusive dentre as mais ortodoxas, consideram e respeitam os animais, quaisquer que sejam, como criaturas de Deus e desta forma, como entidades importantes, que têm direito à vida e que não devem sofrer. Penso que já está passando da hora de revermos a nossa posição de seres humanos (“animais civilizados e racionais”) e também passar a tratar todos animais como eles devem. Ou seja, como entidades vivas, semelhantes a nós.

Como bom exemplo sobre essa questão, quero lembrar que está tramitando no Congresso Nacional um projeto de Lei (PL 3670/2015), que visa mudar a forma de entender os animais juridicamente, como já acontece em alguns países. Você, ser humano responsável, que tem seu “Pet” ou não, mas que também acredita que os animais merecem, ao menos, um pouco mais de respeito, precisa estar atento a esse tipo de legislação e deve estar apoiando essa e outras iniciativas desse mesmo gênero, exigindo o tratamento devido que os animais merecem. Precisamos de leis que deixem de considerar os animais como coisas e favoreçam o tratamento dos animais como criaturas vivas e dotadas de sensibilidade, pois essas leis certamente serão importantes para todos nós e não apenas para os animais de estimação

Luiz Eduardo Corrêa Lima (63)

26 nov 2014

Animais “Úteis” X Humanos “Inúteis”

Resumo: Nesta oportunidade estou voltando a um tema antigo, do qual falei pela primeira vez faz mais de 30 anos, mas que infelizmente ainda é muito mal entendido por grande parte das pessoas, trata-se da “utilidade dos animais” aos interesses humanos e a consequente apropriação antrópica indevida dos animais. O assunto é muito interessante e o texto chama a atenção de que em tempos de postura ecologicamente correta, de necessidade da Educação Ambiental, de apelo sobre a Biodiversidade e sobre tudo de priorização da Sustentabilidade, não é mais possível pensar dessa maneira. Nossas crianças precisam de outro critério para perceber a importância dos animais primeiramente para o planeta.


Animais “Úteis” X Humanos “Inúteis”

Nesta semana, mais uma vez eu tive a infeliz oportunidade de presenciar, num trabalho que pretensamente deveria ser de Educação Ambiental, uma professora falando com um grupo de alunos de Ensino Fundamental, sobre um assunto que eu pensava que já estivesse sendo tratado de maneira diferente nas escolas. Na situação em questão, a professora falava aos alunos sobre os “animais úteis” ao homem, o que é um fato lamentável e que, pelo visto, ainda há muita gente pensando e o que é pior, ensinando assim às crianças.

Historicamente, desde o momento em que cada ser humano nasce ele é levado a entender que há alguns “animais úteis” e outros que não são úteis. Mais tarde, quando a criança entra na escola, lamentavelmente esse ensinamento errado é reforçado pelos professores nas séries iniciais de sua formação. Ora, se alguns animais são úteis, isso implica em que outros animais sejam necessariamente considerados inúteis. Essa é uma conclusão lógica e simples. Alguns ainda vão mais longe nessa conclusão e pensam assim: “já que esses animais são inúteis, então vamos acabar logo com eles”. Pois é, ao longo do tempo, muitas das diferentes civilizações humanas fizeram efetivamente isso, ou seja, trabalharam para destruir e matar todos os animais que eram considerados inúteis e tentaram aumentar a capacidade reprodutiva e ampliar as populações daqueles que eram entendidos como úteis.

Partindo do pressuposto acima, o que pode ser considerado é que grande parte dos homens tem procurado se aproximar cada vez mais dos “animais úteis” e se afastar o mais possível dos “animais inúteis”. Por exemplo: historicamente supervalorizamos as galinhas que nos interessam (são úteis), pois nos fornecem principalmente carne e ovos, além de outras coisas de menor destaque diretamente e subvalorizamos os gambás que não nos interessam, porque não nos fornecem aparentemente absolutamente nada, tanto direta quanto indiretamente.

E se o gambá em questão, por acaso, resolve comer algumas galinhas, aí é que a coisa fica mais feia e desanda de vez, porque desta forma, o gambá, além de inútil, passa ainda a ser visto como um inimigo cruel, que come as pobres galinhas amigas. E o que é pior, nessa situação o gambá inútil ganha ainda outro adjetivo mais desagradável, pois passa ao “status” de “animal nocivo”, que é bem mais degradante e ofensivo do que inútil, porque indica que o animal em questão é útil para causar danos e prejudicar a espécie humana.  Assim, ele é muito mal visto e por isso mesmo é caçado e destruído sem nenhuma cerimônia e sem nenhuma justificativa. Isto é, ele é perseguido apenas por ser um gambá e ser entendido como um animal prejudicial aos interesses do homem.

Considerando que a Educação Ambiental é hoje a expressão de ordem nos projetos ambientais e educacionais é inadmissível que ainda existam professores com essa visão errada da realidade natural e passando e reforçando esse tipo de informação arcaica e absurda aos seus alunos. Esse fato é pior ainda, quando se está num país de grande Biodiversidade. Aliás, sempre é bom lembrar, que o Brasil é o país que detém a maior Biodiversidade do planeta, com cerca de 20% das espécies vivas da Terra e que isso certamente é nossa maior riqueza. Entretanto, para quem pensa em utilidade dos animais, países como o Brasil, tendo muita diversidade biológica, têm muito animal inútil que devem ser destruídos em prol daqueles que nos interessam, os animais úteis.

Essa questão de utilidade dos animais, que nem de longe pode ser considerada verdadeira, foi por mim abordada num trabalho que publiquei há precisos 17 anos atrás (LIMA, 1997), mas parece que ninguém leu, ou ninguém estava muito interessado nesse assunto naquele momento e até hoje continuam desinteressados, porque de lá para cá quase nada mudou acerca dessa questão. Talvez, naquela época a Educação Ambiental ainda não estivesse na “moda”, Biodiversidade ainda fosse coisa estranha e Sustentabilidade fosse uma palavra do outro mundo. Porém, hoje, não dá mais para entender que as escolas primárias continuem falando em animais úteis e inúteis para as crianças, principalmente quando se enfatiza a necessidade de destaque e apoio à Educação Ambiental e à Sustentabilidade através de todas as formas pedagógicas.

Naquele artigo, de 1997, eu já dizia que: “é preciso mudar essa mentalidade drástica de que os animais são bens da natureza doados por Deus ao homem, para sua utilização”. Certamente esse trecho especificamente ninguém leu, ou se alguém até leu, então deve ter pensado que eu era mais um louco blasfemando contra Deus. Que fique claro: não sou contra Deus e nem estou louco. Entretanto, eu insisto que temos que abandonar totalmente essas ideias de “animal útil” e de “animal nocivo”, o mais rápido possível, principalmente nas escolas de ensino fundamental. Esse é uma atitude preponderante para que possamos produzir homens melhores, no que diz respeito ao relacionamento com os demais organismos vivos e para que possamos tratar a todos, particularmente os animais, como sendo organismos fundamentais ao desenvolvimento e à manutenção da vida no planeta. É bom lembrar que biologicamente nós humanos também somos animais e eu ainda não sei muito bem se somos úteis ou inúteis à natureza e ao planeta.

Todas as espécies animais e também vegetais, sem exceção, são de alguma forma importantes para o planeta, senão a natureza não as teria selecionado evolutivamente e assim elas simplesmente não existiriam, ou se tivessem existido, talvez já tivessem sido naturalmente extintas. Desta maneira todas elas são necessariamente úteis ao planeta, independentemente do grau de relacionamento ou de proximidade que possam ter com os seres humanos ou mesmo dos benefícios que possam produzir para a nossa espécie. É isso que precisa ser dito, ensinado e reforçado cotidianamente às nossas crianças nas escolas.

Essa nossa antiga conceituação sociológica de que existem animais úteis e inúteis precisa ser esquecida e apagada de uma vez por todas dos planos de ensino escolares. É preciso que as crianças sejam mais bem esclarecidas, para que se possa evitar problemas mais sérios no futuro, principalmente no que diz respeito às espécies ameaçadas de extinção, as quais se forem mesmo consideradas “inúteis” se extinguirão muito mais rapidamente, pois o homem pensando na sua inutilidade trabalhará no sentido de exterminá-las mais cedo. É óbvio que esse fato, se vier acontecer, trará consequências ecológicas drásticas. Talvez devêssemos arrumar outra terminologia para tratar os “animais úteis”, por exemplo: “animais de interesse antrópico” ou “animais de particular interesse humano”. A nossa apropriação despótica da natureza precisa ser ensinada às crianças de uma maneira mais realista e, ao mesmo tempo, mais crítica, em função dos nossos extremos descuidados éticos e desmandos históricos com a vida silvestre dos demais organismos vivos, em particular com os nossos “irmãos” mais próximos, os animais.

De qualquer maneira teremos que conseguir outro mecanismo para determinar os animais que possam nos interessar mais prioritária e diretamente, porque nos fornecem alguma coisa de aplicabilidade imediata aos nossos interesses. Entretanto, teremos que fazer isso sem deixar de ressaltar a importância desses animais e também dos demais animais para a continuidade da vida no planeta, lembrando que na natureza não existem organismos vivos “inúteis”.

A meu ver, se existirem entidades biológicas inúteis aqui na Terra, devem ser apenas algumas formas de seres humanos que continuam pensando e agindo dessa maneira ignorante e ilógica em relação aos animais. Isto é, buscando padrões particulares de interesse nessa ou naquela espécie animal e assim ampliando as possibilidades de se dizimar as populações das demais espécies porque não encontram aplicabilidade antrópica imediata para as mesmas.

Luiz Eduardo Corrêa Lima

Referência Bibliográfica

LIMA, L. E. C., 1997. A Educação Ambiental e a Utilidade dos Animais: um Contrassenso Sociológico e Naturalístico, Ângulo, Lorena, (67): 6-8.

*Artigo anteriormente publicado no Portal do Recanto das Letras (www.recantodasletras.com.br – Código do Texto T2540866), em 06/10/2010, sendo devidamente modificado e atualizado para esta publicação.

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29 out 2014

A Introdução de Organismos e suas Implicações

Resumo: O Prof. Luiz Eduardo apresenta um tema que precisa entrar mais seriamente nas discussões, quando se fala em manutenção da Biodiversidade e o Brasil como país de maior Biodiversidade do Planeta, precisa estar atento a essa questão. A Introdução de Espécies é uma questão séria que compromete bastante os ambientes naturais e não pode mais ser feita aleatoriamente como no passado.  O texto é bastante esclarecedor e apesar de ter sido publicado em 2008, ainda está bastante atual e por isso mesmo está aqui reproduzido na íntegra. Tenho certeza que será do agrado dos leitores.


 A Introdução de Organismos e suas Implicações

A introdução de organismos vivos em diferentes áreas tem sido um problema ambiental muito sério, talvez o mais sério de todos, no que diz respeito ao equilíbrio dos ecossistemas naturais, que tem acompanhado o homem ao longo de toda a sua história. Outrora, o homem levou, daqui para ali várias espécies e assim modificou muitos dos ambientes naturais, principalmente no entorno das vilas, das cidades e mesmo dos pequenos núcleos urbanos, onde as populações humanas se instalaram e se fixaram ao longo do tempo.

Assim, muitos organismos que o homem, desde cedo, aprendeu a cultivar e a reproduzir através da Agricultura, da Pecuária e da Domesticação, começaram também a se estabelecer em áreas diferentes daquelas regiões primitivas e endêmicas onde se originaram e desenvolveram. O cinturão verde, obrigatório à sobrevivência, trouxe as plantas, a necessidade de carne, do leite e dos ovos trouxe alguns animais, por fim, o relacionamento afetivo e a carência física trouxeram outros animais. Isso sem contar que a existência e o crescimento das próprias cidades, além de diminuir progressiva e significativamente os espaços naturais, também permitiu o desenvolvimento de uma série de outros organismos na casa do homem, em todos os lugares do mundo. A Fauna Urbana e Fauna Sinantrópica (associada ao homem) são quase que exclusivamente as mesmas no mundo inteiro, se não são as mesmas espécies, são espécies muito próximas.

O homem espalhou essas espécies pelo mundo afora, tornando muitas delas, artificialmente cosmopolitas e outras exclusivas de regiões totalmente distintas de suas áreas originárias. Raramente esses organismos voltaram à condição silvestre depois da interferência humana, embora haja umas poucas exceções. Sendo assim, a grande maioria desses organismos continua acompanhando o homem e consequentemente, eles não são mais encontrados nas condições naturais.

Mais recentemente, o homem propiciou alguma volta ao processo de introdução de organismos, por conta de necessidades agrícolas modernas, necessidades médicas ou mesmo industriais. Isso tem produzido efeitos, cada vez, mais maléficos aos ambientes naturais, os quais hoje estão extremamente reduzidos. Alguns desses organismos introduzidos são estimulados na sua capacidade reprodutiva, pois há um interesse, geralmente econômico, na sua multiplicação. Desta forma, modificam-se também os ambientes generalizadamente, criando grandes áreas diferenciadas artificiais para permitir a manutenção dessas espécies. Por exemplo, as áreas para criação de gado bovino ou para produção de soja aqui no Brasil.

Algumas vezes, nem há necessidade de se criar mecanismos adicionais, pois as próprias espécies têm recursos especiais que lhes permitem garantir as novas áreas de ocupação. Por exemplo, as populações de Eucaliptos aumentam no mundo todo, enquanto outras espécies diminuem e muitas até desaparecem. Ora, o Eucalipto é uma planta altamente competitiva que impede a presença e o desenvolvimento de outras na área onde vive. Sendo assim, aquele ambiente vai gradativamente mudando, até que só existam Eucaliptos no local. Isso é terrível, tanto ambiental, quanto social, emocional e moralmente, pois é fácil imaginar o que irá acontecer lá na frente. Uma paisagem homogênea, monótona e triste, na qual os animais praticamente desaparecem e cujo solo fica seco, empobrecido e após sucessivos cortes do Eucalipto fica totalmente estagnado e tendendo a desertificação.

Locais urbanos estão cheios de parques, praças e ruas com arborização exótica e com pássaros e outros animais estranhos à nossa fauna. O pardal, por exemplo, está no mundo inteiro e ainda bem que ele prefere as cidades, imaginem se essa espécie de pássaro resolvesse ocupar áreas naturais, o que seria dos pássaros nativos, haja vista o tamanho das populações de pardais.

Aqui no Brasil, além do Eucalipto já citado, temos alguns exemplos clássicos de introdução muito mal sucedidos e que têm comprometido muito o ambiente natural. Por exemplo, o javali no Pantanal e no Rio Grande do Sul; o Caramujo Gigante Africano, tão em moda, introduzido no Paraná e hoje encontrado em quase todo o país; o cavalo em Roraima; a garça carrapateira da Flórida, na Ilha de Marajó, que já chega ao Paraná e vários outros exemplos lastimáveis.

No passado nós pecávamos mais não sabíamos, porque nós não tínhamos conhecimento dos problemas que a introdução de espécies exóticas poderia trazer, mas hoje não podemos mais concordar com certas práticas. Hoje falamos muito em controle biológico, como uma boa maneira de controlar pragas, o que é uma verdade. Mas, isso não pode ser feito aleatoriamente, não e pode sair por aí colocando um animal para comer o outro sem critério e principalmente, sem controle. O risco é muito grande e talvez, lá na frente, determine um problema maior. A perda, cada vez maior, da Biodiversidade e crescente degradação dos ambientes naturais são em grande parte consequências da introdução de espécies.

Vejam bem, a introdução em si não é um mau negócio, porém as consequências ecológicas da introdução é que podem produzir resultados catastróficos, os quais na maioria das vezes não podem ser solucionados. Desta maneira, a espécie introduzida, acaba por adaptar-se ao novo ecossistema, pois vai ocupar um nicho vago ou competir com uma espécie nativa que ocupe um nicho semelhante àquele que ocupava no seu ambiente primitivo.

Nessa competição, o alienígena (a espécie exótica) acaba se saindo melhor, até porque não possui predadores e nem inimigos naturais na área, ficando mais livre para ocupar os espaços locais. Se, além disso, esta espécie exótica for profícua reprodutivamente, em tempo muito rápido sua população começa a sobressair quantitativamente na comunidade. Geralmente é isso mesmo que acontece, ou seja, a espécie exótica reproduz-se mais e melhor que a nativa, suplantando cada vez mais o número de indivíduos das populações naturais. Com isso, as espécies nativas vão tendo suas populações diminuídas progressivamente, em alguns casos, até a extinção total na área em questão.

Há, em Ecologia, uma noção clara de que duas espécies não podem ocupar o mesmo nicho ecológico. Quando isso ocorre elas entram em competição interespecífica, a qual acaba por levar a continuidade de uma delas e a extinção da outra. As nativas sempre perdem esta competição, exatamente por outras questões ecológicas, como a falta de predadores das exóticas e a dependência efetiva daquele ambiente através de vários aspectos pelas nativas.

A nossa volta está repleta de espécies introduzidas. A nossa mesa tem carne de boi, de porco, de galinha, tem feijão e arroz; a nossa cozinha tem moscas domésticas; a nossa casa tem baratas francesas, a nossa horta tem alface, o nosso jardim tem roseiras a caracóis exóticos, o nosso pomar tem peras e maças, algumas de nossas florestas têm javalis e cavalos. Muitas dessas introduções foram ocasionais e outras foram provocadas. De qualquer forma, no passado, quando fizemos essas introduções não conhecíamos os riscos que elas poderiam oferecer.

Hoje, porém, a questão é muito mais séria, pois além de sabermos dos riscos potenciais, os espaços naturais estão muito mais escassos e um desequilíbrio pode produzir mais facilmente o caos total para os diferentes ecossistemas terrestres. Não podemos desfazer o que já fizemos não há mais possibilidade física para isso e mesmo que houvesse tal possibilidade, existem várias outras questões de ordem social, legal, cultural e até moral, além da problemática ambiental envolvida, que nos impossibilitaria de simplesmente tentar reorganizar as coisas. O mundo está muito longe de sua base natural e não há como retroceder.

Por outro lado, não podemos nos dar ao direito de deixar, outra vez, um inseto, o bicudo, por exemplo, escapar de um Laboratório e virar praga de algodão numa região onde ele jamais poderia ser encontrado naturalmente. A fragilidade dos ecossistemas naturais, em particular os ecossistemas tropicais ricos em diversidade, mas com populações naturais relativamente pequenas e principalmente dos ecossistemas artificiais agrícolas, não nos permite arriscar mais nada. Mesmo as técnicas de controle biológico, tão propagadas hoje em dia, precisam ser bem estudadas, entendidas e controladas para evitar problemas consequentes.

A expressão “inimigo natural” tão usada no controle biológico, precisa ser mais bem definida. Inimigo natural é alguém que atua no controle populacional de outro alguém que vive naturalmente na mesma área que a sua e não uma espécie introduzida que irá atuar no controle populacional de outra espécie. Um animal da Ásia não tem “inimigos naturais” na América do Sul, até porque, naturalmente essas espécies jamais se encontrariam, o homem é quem permitiu e propiciou tal encontro, através da introdução de, pelo menos, uma delas na área da outra.

São conhecidos e famosos os casos das doninhas na Jamaica, dos coelhos na Austrália, dos carneiros nas Ilhas Galápagos e tantos outros em que a introdução de organismos vivos foi um grande malefício e que até hoje trazem problemas ás localidades envolvidas. Mas, não precisamos ir tão longe, temos exemplos aqui bem perto de nós, como a introdução da Rã americana aqui no Sudeste do Brasil, que dizimou a nossa Rã pimenta, a introdução do tucunaré da Bacia Amazônica nos lagos do Estado de Minas Gerais e vários outros exemplos.

Temos que evitar a qualquer custo que o processo de introdução de organismos continue acontecendo de forma arbitrária, pois não temos mais áreas e muito menos tempo para garantir que os resultados possam ser satisfatórios. A Legislação nesse sentido já existe, entretanto é preciso que as pessoas conheçam esta Legislação e se conscientizem de que essa é uma questão séria e que precisa ser tratada corretamente. Além disso, não podemos nos esquecer de orientar as pessoas que é necessário preservar bancos genéticos de espécies nativas em seus ambientes naturais, pois a manutenção da Biodiversidade do planeta é fundamental para a manutenção do próprio planeta e da continuidade dos processos evolutivos que permitiram o atual nível de organização e composição biogeoquímica que a Terra se encontra.

 Luiz Eduardo Corrêa Lima

Luiz Eduardo Corrêa Lima  ]]>