Criação do “Santuário do Jequitibá-rosa”, o gigante da floresta*

Resumo: Nesse texto apresento uma curta exposição da necessidade do plantio de grandes árvores, gigantes como o jequitibá-rosa, para conhecimento das comunidades locais e principalmente para possíveis tentativas de restauração de áreas naturais da Mata Atlântica do Sudeste Brasileiro.


Senhoras e Senhores, bom dia, e muito obrigado pela presença de todos vocês nesta solenidade.

Nosso mundo está caminhando muito mal e por incrível que pareça, está situação caótica deriva de questões históricas simples, que, por ganância de alguns, ignorância de outros e desinteresse de muitos se agravou a ponto de atingir um estado de gravidade extremamente preocupante. Infelizmente, o desleixo humano com as questões ambientais planetárias se agravou de tal maneira em todo mundo, que nos últimos 20 anos a humanidade não tem conseguido mais viver com recursos produzidos pelo planeta anualmente e a cada ano que passa temos aumentado o nosso déficit.  

O Brasil não está fora do cenário citado e deste modo, aqui a situação não é diferente. Entretanto, sendo o quinto maior país do planeta, detentor da maior biodiversidade da Terra e como uma das 10 maiores economias do mundo, nosso país deveria ser um dos principais responsáveis por trabalhar manter as condições ambientais compatíveis com a vida atual e futura. Contudo, interesses menos nobres, têm conduzido o Brasil historicamente a também andar na contramão nessa questão específica. Assim, o Meio Ambiente Mundial e Brasileiro têm sido progressivamente degradado e destruído para atender aos interesses particulares e prioritariamente monetários, sem nenhuma preocupação com as consequências desse perigoso fato.  

Nos últimos 50 anos a humanidade identificou mais detalhadamente alguns dos problemas planetários e passou a se preocupar um pouco mais com a questão ambiental, porém, além do passivo acumulado ao longo de cerca de 15 mil anos de história, as mudanças comportamentais efetivas e funcionais necessárias, ainda estão ocorrendo a passos de tartaruga. O planeta tem mandado seu recado, com eventos extremos e catástrofes cada vez mais acentuadas, mas grande parte da humanidade ainda não quer dar atenção aos avisos. Deste modo, chegamos numa fase em que há necessidade de que toda humanidade se mobilize rápida e progressivamente para tentar minimizar os males e alcançar uma já bastante improvável reversão dessa triste situação. Nesse sentido, o Rotary Club de Caçapava-Jequitibá, a ADC MAFERSA e a Prefeitura Municipal de Caçapava se uniram no intuito de demonstrar que têm o interesse efetivo em fazer o dever de casa.

Este evento de criação do Santuário do Jequitibá-rosa pretende ser uma prova de que reconhecemos a importância da proteção da natureza e de que entendemos que as plantas são os seres vivos que mais identificam a dependência humanidade com o planeta, haja vista que as plantas são responsáveis diretas por inúmeras coisas que garantem a vida humana na Terra. Por conta disso, é fundamental garantir sua sobrevivência e consequente continuidade. É óbvio que nosso Santuário é um exemplo simbólico, entretanto ele tem a pretensão de ser emblemático para a comunidade de nossa cidade e região.

Senhoras e Senhores, pelo Leste brasileiro, desde o Rio Grande do Norte até o Rio Grande do Sul, primitivamente existia uma grande floresta. Na verdade, tratava-se de uma extensa massa verde que compunha um imenso Bioma, bastante diversificado e composto de vários tipos de vegetações distintas. Exatamente por causa dessa intensa Biodiversidade e grande endemismo, o Bioma em questão constitui-se num dos principais “hotspots” (área especial de biodiversidade, porém bastante ameaçada) da Terra e certamente é o Bioma mais destruído e ainda o mais ameaçado do país, haja vista que hoje, cerca de 80% da população brasileira habita exatamente no espaço territorial desse Bioma.

O Bioma em questão é conhecido popularmente como Floresta de Mata Atlântica ou simplesmente Mata Atlântica. Recebe esse nome por margear o litoral do Oceano Atlântico no território brasileiro e por sofrer influência direta da umidade e dos ventos que veem do oceano. Fato que lhe confere algumas características especiais e que lhe garante o forte grau de endemismo, tanto de espécies vegetais, quanto de espécies animais.

Na Mata Atlântica, dentre a vasta diversidade de plantas existentes, ainda podem ser encontrados alguns “gigantes”, os jequitibás, alguns com mais de 50 metros de altura. Dentre esses “gigantes” encontra-se o nosso “Jequitibá-rosa” (Cariniana legalis), mais comumente localizado na faixa entre os estados da Bahia e do Paraná. Entretanto, como foi dito, a Mata Atlântica é o Bioma mais explorado e degradado do país e os “gigantes” que nela ainda existem certamente são espécies bastante ameaçadas e em vias de extinção, pois foram os que mais sofreram com a destruição, por conta do interesse em sua madeira nobre e farta. Desse modo, quase nada do que existiu ainda pode ser observado e principalmente os belíssimos “gigantes”, hoje são naturalmente raros de serem encontrados. 

Na região do Vale do Paraíba, particularmente aqui em nesta área do vale, que inclui Caçapava, até bem pouco tempo atrás ainda existiam alguns remanescentes de grande árvore, por isso mesmo Caçapava é famosa pela ocorrência primitiva do Jequitibá-rosa, que está presente, inclusive, no Hino Oficial do Município e dá nome há vários sítios e entidades da cidade. Entretanto, hoje quase todos os Jequitibás-rosa de Caçapava foram derrubados em nome do “progresso”, mas ainda existem alguns em propriedades particulares e tem um famoso remanescente na beira da antiga Rio-São Paulo, logo depois da divisa entre os municípios de Caçapava e São José dos Campos.

Na verdade, esse Jequitibá-rosa de São José, não é apenas um remanescente, mas é, antes de qualquer coisa, um sobrevivente, por tanto que tem sofrido ao longo da história. Volta e meia alguém tentou derrubá-lo ou incendiá-lo, mas o gigante resistiu e agora aquele exemplar está protegido por uma lei municipal de São José dos Campos. Contudo, seu estado de saúde não é dos melhores e seu futuro é bastante incerto.

Por volta de 1990, eu e alguns amigos que compunham o Conselho Municipal de Meio Ambiente da Caçapava da época, conseguimos cerca de 100 mudas de Jequitibá-rosa do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis ​​(IBAMA) de Lorena e plantamos essas mudas em lugares estratégicos da cidade, mas parece que quase ninguém se interessou por manter a nossa história e tentar proteger essa fabulosa árvore, porque a maioria delas foi totalmente destruída em poucos dias. Algumas sobreviveram um pouco mais e hoje, 32 anos depois, só sobraram pouquíssimos remanescentes daquela época, em propriedades privadas. Esses exemplares hoje têm cerca de 10 metros de altura, mas ainda são jovens e vão crescer muito mais.

Em 2002, como Vereador e Presidente da Câmara Municipal de Caçapava, consegui aprovar um projeto de lei, que foi sancionado pelo Prefeito em 24 de outubro de 2002 e que considera o Jequitibá- rosa como árvore símbolo de Caçapava.  Isto significa dizer que, recentemente fez 20 anos que o Jequitibá-rosa é oficialmente a árvore símbolo da cidade, mas infelizmente a maioria das pessoas não sabe disso e o que é pior, muitos nunca viram um jequitibá.

 Recentemente o Rotary Club de Caçapava-Jequitibá, por conta de completar 30 anos de existência, juntou-se com a ONG Eco Vital e a Prefeitura Municipal empreendendo um projeto de plantar 30 jequitibás-rosa nos pontos extremos e alguns locais da cidade. Esse projeto ainda não está concluído e encontra-se em pleno andamento, ou seja, estamos plantando os gigantes gradativamente. 

Pois então, foi a partir do projeto dos 30 jequitibás, que tivemos a ideia de fazer este “Santuário do Jequitibá-rosa”, com o plantio de um jequitibá (símbolo de Caçapava) ladeado por dois ipês-brancos (Tabebuia roseoalba), que para nós, rotarianos, há mais de 50 anos, simboliza a “Árvore da Amizade”. Aqui, neste “Santuário do Jequitibá-rosa”, temos certeza de que o nossa “árvore gigante” e suas duas companheiras e damas de honra serão devidamente cuidadas e mantidas em segurança e poderão crescer para a posteridade.

Nós, do Rotary Club de Caçapava-Jequitibá, esperamos que esse pequeno ato seja um exemplo significativo a ser seguido para desencadear uma verdadeira noção de proteção de nossa árvore símbolo e quiçá de respeito e de incremento efetivo em projetos progressivos de recuperação de nossa Mata Atlântica primitiva. Esperamos ainda que todos os munícipes consigam entender a importância de manter viva e lembrada essa espécie ícone, que é uma das guardiãs da Mata Atlântica que aqui existiu e que ainda nos auxilia a contar a história de nossa região e mais particularmente, a história de Caçapava.

Enfim, nossa expectativa maior é que este nosso pequenino passo, além de ser um sonho, possa também significar um marco real nas ações de proteção efetiva às árvores nativas da Mata Atlântica, a partir de seus “gigantes”. Deste modo, esperamos que venham os plantios de outros jequitibás e outras árvores na nossa cidade, com a anuência e o envolvimento dos diferentes setores da comunidade caçapavense. Quem sabe assim, todos nós caçapavenses, de nascimento ou de coração, de fato ou de direito, passemos a compreender melhor a importância de proteger e preservar as árvores e as florestas nativas para as nossas vidas e principalmente para vida dos humanos que ainda vão nascer.

Para terminar, queremos agradecer a ADC MAFERSA e a Prefeitura Municipal de Caçapava, pela colaboração e pela parceria nessa empreitada que certamente será um marco para a história de Caçapava. Façamos coro para o crescimento e o desenvolvimento do nosso “Gigante da Floresta Atlântica” e que Deus permita vida longa ao “Jequitibá-rosa” e às demais árvores que surgirão no município a partir desse insigne momento.

Muito obrigado pela atenção.

Luiz Eduardo Corrêa Lima**

*Discurso proferido na cerimônia de criação do “Santuário do Jequitibá-rosa”, na ADC MAFERSA de Caçapava/SP, em 07/11/2022.

** Associado Representativo do Rotary Club de Caçapava-Jequitibá e Presidente da Comissão de Meio Ambiente do Distrito 4.571 de Rotary International.

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